Preto, pobre e suburbano

Esse aqui é o cotidiano de um simples jornalista carioca que mora e circula pra cima e pra baixo na cidade de São Sebastião do Rio de Janeiro. Mas acaba sempre voltando pra a base, em Bangu - terra onde só os fortes sobrevivem pq é longe pra burro e tem que ter saco pra aturar as idas e vindas...

quinta-feira, outubro 25, 2007

Vi nesses dias o tão falado “Tropa de Elite”...

um bom filme, não vou negar, mas que levanta alguns temas que podem e devem ser discutidos pela sociedade. A obra parece ter sido muito bem aceita pela classe média com seu discurso “entrar e matar”. É fácil, o cara de farda preta entra com um fuzil e passa na frente da casa de um cara q mora longe dele dando tiro. Aí é mole. Mas o Bope, o Batalhão de Operações Especiais da PM Fluminense, não é a solução pra violência. Matar é fácil. Você mata uma traficante, tem um moleque desvalido do lado que vai ocupar o lugar porque ele vê ali uma forma de ascensão social rápida (pros moldes que ele tem), ele passar a ter grana e poder. Mesmo porque as mercadorias continuam chegando na favela e as armas também porque, até onde eu sei, favela não tem plantação de maconha nem de coca e muito menos local de refino. Mas ainda assim é mole defender a galera que entra lá aterrorizando que mora na favela e nada tem a ver com quem vende o preto ou o branco.

O filme não mostra, mas um dos terrores atuais da criançada que mora nessas comunidades é o famigerado Caveirão, aquele blindado que entra nas favelas com os biquinhos do lado de fora (bico, na gíria da rua, é o fuzil, já viu como eles são bicudinhos?), tocando o terror ao falar pelas suas caixas de som que está ali que os cidadãos de bem não precisam correr, que só está ali pra “buscar a alma dos vagabundos”. Parece até piada, mas eu não ia curtir ver um carro desses passando na porta da minha casa. “Ah, mas você não mora em favela”, vai dizer alguém. Não moro, mas o fato de eu não morar não vai me levar a achar maneiro que um cara que mora na mesma cidade do Rio de Janeiro que eu viva assim. E digo Rio de Janeiro porque isso existe aqui, mas se fosse em qualquer outra cidade do mundo eu falaria a mesma coisa. Um amigo, o Retratista Arruda, sangue-bom, crítico, mas que por sua origem em outra parte da cidade, tem uma visão diferente da minha, contou que a origem desses blindados foi na África do Sul durante o apartheid, para a polícia branca entrar nos cantos pobres (e negros). Não fui checar, mas dou crédito ao camarada.

O extermínio puro e simples não vai solucionar nada, só vai acentuar a ruptura que existe nessa cidade entre moradores da favela e do “asfalto”. O filme levanta a questão do financiamento do tráfico por conta da classe média que consome as paradas. Já discuti com amigos usuários que defendem a descriminalização, só pra usar o termo corrente, da venda. Dizem eles que o tráfico acaba, mas sei lá, o argumento não me emociona, se bem que o consumo de drogas é freqüente, constante e me parece inerente ao gênero humano. Mas isso cabe uma discussão que não vou me propor a ter aqui. Eu ainda acho bola fora defender que se venda em farmácia ou padaria ou sei lá onde, mesmo porque entendo que se criaria outra série de problemas.

Mas, hoje em dia, a parada é errada. É tão errada que há as práticas apontadas no filme de um hipocrisia atroz que mostre, talvez, o peso na consciência de vários setores que aquela ajuda limpa sua barra já que, mesmo inconscientemente, entende que ta fazendo cagada pra galera que mora naquele pedaço pouco assistido pelo Estado. Em lugar disso, que tal tratar com mais igualdade e respeito o favelado? Só passar a mão na cabeça e sar assistencialista ajuda nada. Só, de certa forma, afirma a diferença de “só nós podemos ajudar vocês”. Ah, e o q falar das passeatas pela paz? Olha, com todo respeito, é muito pouco provável que eu seja visto numa passeata dessas. Por quê? Não, não eu sou contra a tal paz, sou contra a hipocrisia da galera que acha uma ação sensacional ir pra rua protestar contra a violência e não move um dedo pra uma ação eficaz. A sociedade já chegou a um ponto sinistro de saturação de violência, mas não é ir pra praia com camisa branca que vai dar paz pra ninguém. Já postei sobre isso alguma vez, mas volto a postar agora, paz está nas atitudes cotidianas, em tratar bem, em não espezinhar, em não esculachar o cara que está em uma situação inferior, é não abusar dele e procurar ajudar, diminuir a distâncias. Alguns chamam de amor, outros de compreensão, eu chamo de vergonha na cara e parar com hipocrisia.

Das cópias piratas eu falo em outro hora.