Preto, pobre e suburbano

Esse aqui é o cotidiano de um simples jornalista carioca que mora e circula pra cima e pra baixo na cidade de São Sebastião do Rio de Janeiro. Mas acaba sempre voltando pra a base, em Bangu - terra onde só os fortes sobrevivem pq é longe pra burro e tem que ter saco pra aturar as idas e vindas...

segunda-feira, junho 30, 2003

Um dia em que eu estava na cidade errada

Dia 28 de junho de 2003. Tudo, mas tudo errado. Primeiro pq havia prometido pra mim mesmo que estaria em Recife no casamento de Kléston, grande figura, designer, paraense, irmão de RMRO, primo de Catirina, amigo de STA e Bicha Superpoderosa, torcedor do Sport, marido da Top e definitivamente sangue bom. Não deu, ficou muiiiito puxado pra esse trabalhador braçal da Comunicação ir até a capital de Pernambuco e voltar num fim de semana. Um vôo básico fica por mais ou menos mil reais.

Nesse vazio do que fazer, optei por assistir o Mais Querido no Maracanã. Seria teoricamente um jogo fácil com três pontos fáceis. Tudo teoricamente. Como o faz-me-rir só sai essa semana, não tinha dinheirinho para bancar o esforço de ir ao jogo. Seu Carlos patrocinou a parada. Mas antes, para dar uma de bom menino ainda atendi um pedido de D. Glória, o que me fez perder a hora.

No fim das contas, após vazar com Ervilhão varadado pela Avenida Brasil, cheguei no Maracanã com 15 minutos de primeio tempo. Faltava encontrar companheiro Jacomo-negão, o único jornalista de dreadlocks que conheço. Já no fim da primeira etapa encontro o companheiro. E aí vem uma supresa. Próximo dele vejo um amigo de infância, que cresceu comigo em Bangu, mas que mora em Fortaleza. Com o maior prazer vou falar com o cara. É sempre bom ver pessoas queridas.

Aí terminaram os bons momentos no Maracanã. Nesse dado instante, parece que um condor cagou bem no meu cucuruto...

O sábado fica ainda mais triste
Meu camarada, irmão do moleque que juntou a galera e comprou um barril de chope semanas atrás pra gente assistir outro jogo do Flamengo, estava com seu irmão mais novo e o cunhado, esse uma alma sebosa sem precedentes.

Sou absolutamente passional nas arquibancadas. Não sou em casa, mas no Maracanã, num jogo do meu time e na minha torcida, eu falo, grito, pulo, choro, vou a loucura. Quem já me acompanhou num momento desses sabe da minha paixão. É justo um momento em que ponho tudo pra fora, saio dali levinho, levinho, ainda mais quando o time ganha.

Pois bem, o tal alma sebosa era torcedor do rival carioca, o time da colina. Ficou todo o resto do tempo cantarolando musiquinhas do referido clube, cantando musiquinhas do Cruzeiro, torcendo contra em voz alta. O incomodo era flagrante. Todos os torcedors nos arredores já olhavam pro moleque de cara feia. Pô, se o cara quer torcer contra, que torça, mas respeite a maioria. Ali é jogo do nosso time e no lado onde a nossa torcida costuma ficar, à esquerda das tribunas.

Quando houve o primeiro pênalti, minha paciência acabou. Olhei pra ele e disse "se rolar gol, vou te encher de porrada". Não deu outra. Foi gol e parti pra cima da criatura que comemorava feliz da vida.

Papa Mike na parada
A ficha caiu logo depois. Pô, não posso fazer isso, não posso bater em um infeliz inconseqüente. Se ele nao tem responsabilidade, eu tenho. Mas já era tarde. Com a ficha já caída, dei-lhe um esporro gritando com os dois dedos na cara da criança. Parei quando um papa mike veio falar comigo.

O moleque, cheio de covardia, veio querer me pegar pelas costas. Perdeu, o papa mike o impediu. Aí veio o caô "quero ir pra DP, quero dar queixa". Haha. Achou que eu fosse arregar. Eu disse, "vâmbora". Já ciente da cagada, não ia ficar sofrendo. Se ele quer levar até as últimas conseqüências, levo da mesma forma. E quero ver me acompanhar.

Quando um dos papa mikes que conduziam o procedimento me pediu para acompanhá-lo enquanto pedia uma viatura para nos conduzir para DP, provavelmente meu camadara e cunhado da alma sebosa mandou a critura se adiantar. Quando todos voltamos, ele havia sumido. E se não há queixante, não há queixa.

Diante da situação, os papa mikes (absolutamente cordiais, é bom que se diga) me pediram para ficar sentado perto deles. Deram-me, como toda razão, um belo sermão. Eles sacaram que eu não era desse tipo de coisa, visto que tenho 20 anos de Maracanã e nunca me envolvi em qq tipo de briga, confusão ou similar. Jacomo-negão chegou, ao meu lado, confirmou minha história.

Castigo
Foi só voltar pra arquibancada e vi outor pênalti pro Figueira e o conseqüente gol. Voltei ainda em tempo hábil para ver o segundo gol dos caras. Some-se a isso, a total ciência de que cometi uma grande cagada e, pior, fiz feio pra burro no reencontro com o camarada de infância. No fim das contas, a consciência é que ficou mal.

Os papa mikes ainda me disseram que dei mole por um simples fato. Era só chegar até eles, relatar o que se passava que ele retirariam o elemento das nossas proximidades. Agora já sei.

"Libera ele!"
Ao menos não foi tudo perdido. Quando voltei para a arquibancada, a galera que estava nos arredores ficou gritando "libera ele! libera ele! libera ele!". Alguns ainda desceram para falar com os papa mikes, dizer o que viram. No fim do jogo, os papa mikes me cumprimentaram e disseram que não queriam mais me ver nessa situação. E eu ídem.

Ironia. Ainda acabei aquela tarde infeliz como herói de alguns. O tal moleque péla-saco tem histórico, é um marrentinho e folgadjo já conhecido, já levou uns belos botadões nos cornos dados por Irmão-Léo anos atrás quando eram adolescentes. Acabei lembrando disso depois. Só que, além de cunhando do parceiro, é sobrinho do meu padrinho, aquele mesmo absurdamente figura e amigo do meu pai. Bom, deixa quieto.

Se meu time ganha eu nao ligo pra ninguém de time derrotado, nao vou gritar na porta de ninguém e nem ficar ficar fazendo piadinho no dia seguinte. Venceu? Blz. Mas nao vou tripudiar. Nao gosto. E da mesma forma que nao gosto, nao admito que faça comigo. A proposta é: tratas as pessoas da mesma forma como deveria ser tratado.

Espero que ao menos aquele moleque seboso tenha aprendido a não mexer com a paixão dos outros. Se eu estivesse em Recife nada disso teria acontecido... :-(