Preto, pobre e suburbano

Esse aqui é o cotidiano de um simples jornalista carioca que mora e circula pra cima e pra baixo na cidade de São Sebastião do Rio de Janeiro. Mas acaba sempre voltando pra a base, em Bangu - terra onde só os fortes sobrevivem pq é longe pra burro e tem que ter saco pra aturar as idas e vindas...

quarta-feira, setembro 17, 2008

Diz o ditado que “a ocasião faz o ladrão”, mas ando pensando em outro também: “no lugar certa e na hora certa”. Penso nessas coisas porque, ao ver o que aconteceu com um amigo, fiquei pensando que a sorte ou alguma proteção divina são coisas que realmente existem para alguns.

Um amigo, mulato e de cabelo carapinha, é dono de um carro novo, arrumadinho e tal. Ele, que pode ser incluído no grupo dos figuraças, dirigia seu veículo pelo bairro onde moramos despreocupadamente quando foi abordado de forma violenta, com policiais militares apontando armas em sua direção por ser um sujeito em atitude suspeita. Saiu ele do carro com os braços para o alto, foi abordado, mostrou seus documentos e foi liberado. Mas o constrangimento ficou. Não foi a primeira vez que foi vítima dessas abordagens dos brucutus que usam farda e que deveriam cuidar da segurança pública. Em outra oportunidade ele já havia sido abordado por homens da mesma corporação por ser “suspeito”.

Não só ele, eu mesmo tenho histórias de ser também um sujeito “suspeito”. Uma vez, ao levar a namorada em casa, fui abordado por um policial apontando uma escopeta para minha cabeça. Veja só, uma singela escopeta (aquela calibre 12 mesmo) que, se tivesse sido disparada, deixaria para meus pais um corpo sem cabeça para o enterro. Em outra oportunidade, eu, eu mesmo, passei por uma blitz. Passei em baixa velocidade, acendi a luz interna do carro e fui adiante. Segundos depois os membros da corporação correram para o meio da rua, todos apontavam metralhadoras na direção do carro que eu dirigia e me mandavam voltar. Pus a cabeça pra fora do carro e perguntei: “É comigo?”. Eles disseram que era. Voltei de ré, lentamente pra não virar alvo dos pipocos. Perguntei porque haviam mandado eu voltar. E a resposta foi que passei rindo dos policiais, veja bem, quem, em sã consciência, passaria por uma blitz feita naquela ocasião pelo Batalhão de Choque rindo de alguém? Poderia ter virado peneira.

Ao contrário do que pode parecer, penso que a sorte estava do meu lado. Um vacilo meu ou até mesmo dos homens de farda poderia ter impedido que eu fizesse esse pôste agora. Provavelmente alguns não tiveram essa mesma oportunidade e apareceram como traficantes ou bandidos. “A ocasião faz o ladrão”, mas também pode fazer o presunto. E quantos devem ter morrido por aí, de bobeira, porque pareceram “suspeitos”, como eu e meu amigo? O que nos faz parecer suspeitos? Por que somos tão “perigosos” aos olhos desses homens de farda? Graças a Deus (sim, acredito muito em Deus), nunca estive de fato “no lugar errado, na hora errada”. Tomara que eu e meu amigo nunca estejamos. Tomara também que os homens de farda deixam de nos ver como homens potencialmente perigosos. A polícia militar do lugar onde vivo me dá medo.