Preto, pobre e suburbano

Esse aqui é o cotidiano de um simples jornalista carioca que mora e circula pra cima e pra baixo na cidade de São Sebastião do Rio de Janeiro. Mas acaba sempre voltando pra a base, em Bangu - terra onde só os fortes sobrevivem pq é longe pra burro e tem que ter saco pra aturar as idas e vindas...

quinta-feira, novembro 03, 2005

Kelly Key?? Na van??

Dia desses, melhor dizendo, madrugada dessas, voltava eu pra casa. Estava pelos lados da Tijuca, onde passa o 607 (Rio Comprido-Cascadura), um coletivo q roda toda a noite, mas é murrinha q só.

Tava um frio chatinho, acompanhando de uma chuva chataça. Foram quase trinta minutos pastando até o 607 passar. Ok. Passou. Subi. Tava quentinho lá dentro. Dormi super tranqüilo, abraçado à minha mochila. Quarenta minutos depois estava em Casacadura, ponto final, momento de descer. Teoricamente o ponto final do "meia bola sete" é sopa no mel. Três ônibus que servem pra mim partem dali. Mas como nem tudo é quentinho, sequinho e leva pra casa, NENHUM dos ônibus estava por lá. Zero coletivo.

Opção?

Apelar pras sinistras kombis e vans que fazem o trajeto.

Até então eu me mantinha de pé, embaixo de uma amendoeira que deixava filetes de água pingarem ajudando no desconforto. Tava lá, firme, tremendo de frio, mas firme. Tinha fé q um ônibus passasse e fizesse o carreto pra Bangu.

Aí, um negão que estava sentado na base da amendoeira como um Buda gritou: “Kelly Key, faz o carreto aí!. Vai até Campo Grande”

Uau. Imaginei a minha figura caminhando na direção da van ouvindo “vem meu cachorrinho q agora eu to mandando”.

Ok, pintou a van com a porta aberta e para dentro dela pulei. E aí pinta o personagem título desse pôste: Kelly Key.

Vem caminhando um negão com mais ou menos 1,90m de altura. Cabelo com tranças presos na altura do pescoço, vestindo camisa azul clara pólo que parecia ter uma bola ou mesmo uma barriga que parecia um globo, uma calça jeans absolutamente desbotada e calçava um par de havaianas pretas. O horror! O horror! Imagina a figura. Pois é, esse era Kelly Key...

Beleza. Podia ser quem fosse, queria mais é que me levasse para Bangu. E lá foi a van.

Em dado momento percebi um não muito agradável cheiro de comida dentro do veículo. Sabe aquele cheiro q começa a revolver o estômago? Tomava o interior da van no decorrer do caminho.

Olhadas meio discretas pra um lado, olhadas meio discretas pra outro... Qual era o furingudo que tava comendo ali dentro?!

Quando os olhos passam pelo volante... vejo um garfinho de plástico na mão direita de negão Kelly Key. Comecei a entender o q se acontecia...

O piloto figura dirigia o carro comendo. Vez por outra descia o garfinho de plástico e subia com algo espetado. Nesses momentos o cheirinho nada bom aumentava. Ele carregava algo parecido com um pratinho de alumínio com pedacinhos de carne e farofa, o famoso "surrasquinho com farófia".

Diliça de viagem.

No fim das contas foram quase duas horas pra percorrer um trajeto que, de Ervilhão – o foclórico Gol Bolinha – seria feito em trinta minutos. Salve a suburbanidade que me permite essas experiências.