Preto, pobre e suburbano

Esse aqui é o cotidiano de um simples jornalista carioca que mora e circula pra cima e pra baixo na cidade de São Sebastião do Rio de Janeiro. Mas acaba sempre voltando pra a base, em Bangu - terra onde só os fortes sobrevivem pq é longe pra burro e tem que ter saco pra aturar as idas e vindas...

terça-feira, junho 22, 2004

Hoje deu vontade de escrever... Vou relatar minha volta pra casa após o trabalho.

Saí do escritório lá pelas 18h30, fui pegar o trem na Central. Não é normal q eu tome essa opçao, mas olhando o trânsito parado nas principais vias, nao tive dúvida. Fui pra gare.

Entrei, paguei meu R$1,35 e pulei no último vagão do Santa Cruz q sairia às 18h55. Tava lá, pensando na vida. No tudo, no nada...

Já se entrando pela Zona Norte um cheirinho bom começou a pintar. A cada vez q o trem parava numa estaçao próxima às casas um cheirinho bom de feijao entrava pelo vagao. Sabe aquele feijao de mae? Pois é, me enchia de água na boa. Existem algumas estaçoes onde as casas sao separadas só por um muro.

Já com fome, um vendedor anunciada sua paçoca por R$0,10. Dez centavinhos... Geral comprou. Via notinhas de um real pulando na mão do camelô, gente comprava sempre mais de uma paçoca. Tb pudera, depois do cheirinho do feijao de mae o docinho de amendoim até q caía bem pra enganar a fome...

Do lado de fora, os bares (botecoes mermo, aqueles bem copo sujo, bem caga-sangue) cheios. A marmanjada descendo dos onibus e dos trens, tomando um gelolzinho (=cerveja) antes de se dirigir pra casa e encontrar suas 'donas patroas.

Já em Magalhães Bastos surgiu a figuraça do dia. Um senhor com cabelo como o meu, rascunho de bléquipauer, um boné azul surrado de campanha de deputado federal, uma camisa bege tb surrada, óculos de armaçao de arame grosso, uns pouquíssimos dentes espalhados pela gengiva. Mas o visual nao era tudo. Ele era camelô tb, vendia jujuba de menta. Vinha desde o outro extremo do vagão meio q uivando. Quando chegou mais perto pude perceber q nao uivada na realidade, dizia "Vai acabar!". Referia-se ao seu produto. Agora, como ele conseguia fazer o fonema A sair uivado é q nao faço a menor idéia. Mas foi bem na minha frente, eu vi e ouvi.

Tive até vontade de comprar. Era um por R$0,20, dois por R$0,50. O sujeito desceu em Realengo.

Fiquei imaginando como o cara conseguia uivar falando "vai acabar" quando olhei pra frente e tava lá, a quadra da Mocidade Independente. Logo, Padre Miguel. Td na boa, a próxima estaçao já era a minha, Guilherme da Silveira.

Nem vi q já tinham passado as vinte e quatro estaçoes. Desci do trem às 19h 40. Rapidinho.

Hoje nem foi doloroso voltar pra casa.