Preto, pobre e suburbano

Esse aqui é o cotidiano de um simples jornalista carioca que mora e circula pra cima e pra baixo na cidade de São Sebastião do Rio de Janeiro. Mas acaba sempre voltando pra a base, em Bangu - terra onde só os fortes sobrevivem pq é longe pra burro e tem que ter saco pra aturar as idas e vindas...

segunda-feira, março 22, 2004

Um mané sem carteira de motorista, abordo da Grande Ervilha Mecânica pela madrugada carioca

Mesmo com uma dor quase insuportável no ombro direito, saí na noite de sábado. Havia prometido a uma amiga levá-la ao forró. Levei, né. Promessa é dívida. Fomos ao Malagueta, ali em São Cristóvão. Como bom menino q sou fui buscá-la em casa, no Valqueire, e depois a desovei no mesmo ponto. Só q após a noite com zambumba, triângulo e sanfona tocando soltas, ainda no caminho de volta, veio a lembrança. Ou melhor, lembrei de ter esquecido, por mais contraditório q pareça. Esqueci o documento do carro.

Agora, na boa, eu, esse sujeito dessa cor, o tipo físico do malandro carioca, dirigindo seu carrinho de madrugada pelo Rio de Janeiro... era só uma blitz me parar e pronto: tava eu lindamente pegado. Tava errado, sem carteira de motorista. Olha o prato cheio pos puliça tocarem um terror comigo.

Saindo do Malagueta optei por ir seguindo a linha do trem, pela Rua 24 de Maio em lugar de pegar a AVenida Brasil. Foi só descer o viaduto de São Cristóvão e me deparar com Maracanã. Em frente a ele, na Radial Oeste (q em sua continuidade tem a 24 de Maio) estava um blitz. Ao lembrar de nao estar com o documento gelei. A amiga, q nas horas vagas é advogada, me tranquilizou. Mas e depois de deixá-la em casa? Ia ser uma presa fácil, fácil...

Do Valqueire até Bangu nao deve ser mais do 10 quilômetros. Eu com o rabo entre as pernas, na total certeza de estar errado, estar devendo. Odeio essa sensação, por isso procuro sempre andar na linha. A cada curva era uma nova emoção. Não pela velocidade, mas pela torcida em não encontrar uma blitz. O pior é a pista sinuosa q vai do Valqueire até a Piraquara, cortando toda a Sulacap...

A cada vez q via carros parados em sinais ao longe e aquele monte de luzes vermelhas juntas pensava: "perdi, os 'homi' tão ali". Nunca fui tão no sapatinho pra casa. Já em Padre Miguel existe um ponto certo, certíssimo de ter uma blitz. Eu já passo ali com tanta frequencia q ninguém me para, mas sacomé, né, quando tu tá errado tudo acontece. A essa hora eu já tinha acionado até a padroeira.

Quando cheguei na curva anterior o cagaço tomava conta... quando apontei no lugar e vi q nao tinha ninguém... pisei, mas pisei muito pra chegar em casa. É uma retinha simples, merreca pra ser percorrida até por Ervilhão, um gol mil. Ufa. Quando cheguei em casa nem guardei o carro na garadem, desovei mermo na calçada e corri pra dentro pra ver se encontrava o mané do documento. Tava exatamente no mesmo lugar onde eu devia te-lo pego.

Mané é mané. Mas o mané sem sorte já nasceu morto.