Preto, pobre e suburbano

Esse aqui é o cotidiano de um simples jornalista carioca que mora e circula pra cima e pra baixo na cidade de São Sebastião do Rio de Janeiro. Mas acaba sempre voltando pra a base, em Bangu - terra onde só os fortes sobrevivem pq é longe pra burro e tem que ter saco pra aturar as idas e vindas...

quinta-feira, agosto 21, 2003



A Paula-que-gosta-de-samba postou ontem ou anteontem sobre a iniciativa do Antônio Candeia Filha, o Candeia, em tocar uma iniciativa paralela às escolas de samba no subúrbio carioca. A tal iniciativa tinha como objetivo difundir e defender a cultura popular. Candeia também foi compositor reconhecidíssimo e um líder que procurava valorizar a cultura negra.

O sambista estava muito a frente do seu tempo, foi ele que inventou aquela coisa de ala de passos marcaos ainda na década de 50. Foi um dos precursores dos grupos de samba vocais e instrumentais. Só que, quando era policiail (mesmo sendo um artista top, não vivia do samba), em 1965 (acho), levou um teco na espinha e passou a viver numa cadeira de rodas.

E Candeia parou? É ruim. Aí que ele virou líder mermo. Juntou uma galera do samba, já descontente com os rumos das escolas de samba, correu atrás pra fundar o Grêmio Recreativo de Arte Negra e Escola de Samba Quilombo.

Sambista e ativista que defendia a cultura negra, o cara ainda escreveu um livro que sou louco pra ter e ler "Escola de Samba, árvore que esqueceu a raiz". Mas nem o outro autor o tem. Já pedi pro próprio e não rolou. :-(

O Quilombo encerrou o desfile das grandes escolas ainda quando rolava avenida Rio Branco, de 1978 a 1981.

A sede da agremiação ficava em Coelho Neto, na Zona Norte, onde se cultivava jongo, maracatu, capoeira e o que mais fosse oriundo das raízes negras. Cultivava-se e pesquisava-se a cultura negra. Uma pena que o cara morreu cedo, com 43 anos... Nem o vi, eu tinha dois anos quando ele se foi. Vaso bom quebra fácil, né.

Essa passagem aqui eu copiei do livro no Nei Lopes, o Guimbaustrilho. Nei escreveu o discurso do Candeira na inauguração do Quilombo.

Estou chegando. Venho com muita fé. Respeito mitos e tradições, (...) busco a liberdade, não admito moldes. (...) Minhas portas estão abertas, mas entre com cuidado. Aqui todos podem colaborar mas ninguém pode imperar. (...) Não quero títulos, não almejo glórias. Faço questão de não virar academia, tampouco palácio. Eu sou o povo. Basta de complicação (...).'

A Portela é a agremiação que mais produziu sambistas com liderança e discernimento crítico a respeito da nossa cultura popular. Acima de tudo, por conta disso, tiro e sempre vou tirar o chapéu e respeitar a azul e branco de Osvaldo Cruz e Madureira.