Preto, pobre e suburbano

Esse aqui é o cotidiano de um simples jornalista carioca que mora e circula pra cima e pra baixo na cidade de São Sebastião do Rio de Janeiro. Mas acaba sempre voltando pra a base, em Bangu - terra onde só os fortes sobrevivem pq é longe pra burro e tem que ter saco pra aturar as idas e vindas...

quinta-feira, novembro 18, 2004

E lá vai o sectarismo da sociedade carioca subindo a ladeira


Ando ficando assustado com o q tenho visto por aqui. Ontem duas coisas me fizeram ficar de orelha em pé. Já de manhã, vendo o noticiário local matutino, lá pelas 6h15, um representante do setor hoteleiro do Rio disse q a lei é muito branda com os menores. Os menores aos quais ele se referiu são os pivetes que fazem a maior parte dos assaltos na orla do Rio. Aí, horas depois, já no trabalho, um maluco q é sangue-bom, gente boa com quem sempre cruzo pelos corredores, criticou a postura da imprensa em mostrar q um assaltante, preso em flagrante, foi espancado dentro da Delegacia.

O cidadão comum está radicalizando seu pensamento, está pensando de maneira mais sectária. Ao contrário de pensar em uma forma de manter os moleques de rua ocupados, estudando, fazendo esporte, aprendendo algum, tendo alguma oficina, acha melhor mandar pra prisão. Deixá-lo maracado socialmente e sem volta para um vida dentro da lei. Ou mesmo se preocupar em dar oportunidade pro cara, não se cogita em olhar pra ele, o menor, como um ser humano. Não se pensa nisso em momento algum! Se pensa em trancafiar a molecada.

Já no cara preso, acham mesmo q o sujeito tem q ser esculachado. Como assim? A lei, a Justiça existe pra quê? Pra quê, meu Deus? Tem de se respeitar a integridade física do cara. Tem sim. Vou dar só um exemplo simples e egocêntrico, não impossível de acontecer. Se os papa mikes acham q estou em atitude suspeita, q posso oferecer perigo para outras pessoas, isso lhes dá o direito de já vir me agredindo? De me esculacharem? O meu tipo físico é o mais comum na cidade, é o tipo físico do sujeito q se envolve em parada errada. Antes de ter algo contra mim, ou mesmo já tendo, isso lhes dá o direito de bater em mim? Quem são eles pra me agredir? Quem lhes deu essa autoridade? Já fui agredido por policiais em duas oportunidades, em um ônibus, quando um papa mike deu um tapa no boné q eu usava e o jogou longe pq achou q eu tava ignorando ele, sei lá. E em outra quando uns policiais cismaram q eu furava fila pra comprar ingresso no Maracanã e levei com o cacetete nas pernas. Seguindo a forma de pensar dessa galera, os policiais estariam errados? O q me faria ter um tratamento diferenciado? O fato de eu ter minha carteirinha de jornalistas no bolso? E se eu estiver sem ela e me acharem suspeito de algo, vão poder vir e bater em mim?

Todo mundo fica indignado ao ver um igual, alguém da mesma classe social sendo maltratado por quem quer q seja pq vislumbra ali a possibilidade de tb sofrer a agressão. Mas quando é em alguém de classe mais baixa tudo parece mais aceitável. Isso é um absurdo. Essa sensação de medo q afeta a maioria da pessoas está fazendo com q o cidadão comum se brutalize. Fazendo com q o próximo seja visto como um inimigo em potencial. Ainda mais quando o próximo tem aparência de ser alguém mais simples, mais pobre. Seguindo essa linha de raciocínio não vou me surpreender sem em dez anos as favelas cariocas tiverem sido muradas em nome da segurança da classe média.

Saco, odeio isso tudo.